Por Carlos Antonio redacao@folhauniversal.com.br Em dezembro de 2003, quatro jovens saíram de casa para o que prometia ser uma noite de diversão no Via Show, casa de espetáculos na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro, e nunca mais voltaram. Seus corpos só foram encontrados 6 dias depois. Eles foram torturados e executados com tiros de fuzil na cabeça por policiais militares que trabalhavam como seguranças da casa. Passados quase 6 anos, Elizabeth Medina Paulino, mãe de Rafael, de 18 anos, e Renan, de 13, continua lutando para que o crime, igual a tantos outros, não se transforme em mais um número da estatística sobre a violência policial. 6 – Você tem medo de que a sua luta também a transforme em uma vítima da violência? Eu só tenho medo é de não ver a justiça ser feita. De meus filhos terem sido mortos em vão, de virarem número. Tenho muito medo de que outros jovens sejam assassinados como meus filhos foram. E tenho muito medo de que esses assassinos continuem matando. Esses são os medos que eu tenho. 7 – Que conselho daria a quem passa pelo que você passou? Quando meus filhos foram mortos, uma mãe deu entrevista e disse que se sentia culpada pela morte dos meus filhos porque o filho dela tinha sido morto na mesma casa de shows 1 mês antes e ela se calou por achar que não daria em nada. Ela tinha medo das represálias com parentes e se calou. Peguei isso como exemplo para tentar evitar que outras mães passem pelo que estou passando. O silêncio das vítimas só estimula mais a violência. 8 – Como é a vida sem seus filhos? Minha casa está vazia. Renan tinha 13 anos e foi à casa de shows para festejar a aprovação para a oitava série. Eu nunca tinha negado nada a ele. Rafael tinha 18 anos e o sonho de ser juiz. Ambos eram evangélicos e eu confiava plenamente nos dois. Jamais imaginaria que iria perder os dois por causa da brutalidade policial. 9 – No que a morte deles pode contribuir para uma sociedade melhor? Quando eu ouvia falar que jovens eram mortos por policiais, eu pensava: “esses garotos devem ter envolvimento com drogas”, essas coisas. Com a morte dos meninos, descobri que a coisa não funciona assim. Qualquer um pode ser vítima de maus policiais. Esse é o pensamento que procuro transmitir para a sociedade: a violência policial está muito grande e a gente desconhece isso até que se torna vítima dela. E nós tomamos conhecimento da violência policial da pior forma possível. 10 – Como você tem buscado forçar para suportar a dor? Com Deus tudo fica mais fácil, até as coisas que parecem muito difíceis de serem suportadas. A mídia diz que vítima é quem morre, mas eu digo que as vítimas são as que ficam. E a fé é que me ajuda a prosseguir nessa luta.1 – O que é mais difícil para alguém que perdeu os filhos por causa da violência policial? Além da dor, que não é fácil de suportar, existe a luta para se fazer justiça, colocar os culpados na cadeia. E isso se torna muito mais difícil quando os assassinos são policiais. O corporativismo é muito grande, o que se soma às dificuldades naturais de se fazer justiça no Brasil. 2 – Você acha que se não continuasse lutando o assunto já teria sido esquecido? Com certeza. Meus filhos seriam apenas mais um número como tantos outros que já morreram vitimados por violência policial. E é justamente isso que a gente está tentando mostrar no livro “Auto de Resistência” e no documentário “Luto como mãe”. Rafael e Renan não eram números. Eles tinham sonhos e história. Se desistimos, as mortes são banalizadas, como acontece por aqui. Afinal, um dia morre um, noutro dia morrem mais dois. A nossa luta é para que a sociedade encare esses assassinatos com o horror como precisam ser encarados. 3 – Você enxerga progressos em sua luta? Afinal, já passaram diferentes governos. E muitos secretários de segurança. A coisa já foi bem pior. As mães dos filhos mortos na tragédia de Acari dizem hoje que não tinham consciência de que poderiam brigar por justiça, que poderiam chegar ao governador. Elas não tinham essa alternativa. Hoje, as pessoas já sabem que podem ir mais longe em defesa dos seus direitos . 4 – Você tem acompanhado o processo de perto? Eu acompanho tudo. Vou à delegacia responsável pelo caso e conheço cada letra dos inquéritos abertos sobre o assassinato dos meus filhos. Graças a Deus, ainda tenho tempo, saúde e recursos para continuar lutando, para não ver mais um crime desse tipo ficar impune. Enquanto tiver forças, eu vou lutar. 5 – O que achou das penas aplicadas aos policiais envolvidos no caso? Imagine se viesse uma pessoa e, sem ter motivo, torturasse e matasse seus filhos? Quantos anos o senhor acha que ele deveria ficar na cadeia? Essa pergunta não tem resposta. Eles pegaram 68 anos e não vão ficar presos nem a metade desse tempo. Por enquanto, só dois estão cumprindo pena e dois estão respondendo em liberdade. Nossas leis são falhas, nossa Justiça é falha e nossa luta também é por esse lado. É para que se tenha uma Justiça menos injusta no País. |
ENTREVISTA: Elizabeth Mendes Paulino - “O medo alimenta A violência“
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